terça-feira, 3 de maio de 2011

Bauhaus

Vamos criar uma nova guilda de artesões, sem a distinção de classes que ergue uma barreira arrogante entre o artesão e o artista!
Walter Gropius , MANISFESTO DA BAUHAUS, 1919

A Bauhaus (*casa para construir, crescer e nutrir) foi uma escola sediada em Weimar, Alemanha, em abril de 1919, sob a direção do arquiteto Walter Gropius (1883-1969). Foi formada pela corporação entre a existente Academia de Belas-Artes de Weimar e a Escola de Artes e Ofícios, visando capacitar os alunos na teoria e na prática das artes, dando-lhes condições de criar produtos que fossem ao mesmo tempo artísticos e comerciais. Groupius imaginava uma comunidade em que professores e alunos morariam e trabalhariam juntos. Esse conceito se reflete no nome do grupo, que alude às choupanas dos pedreiros medievais (Bauhütten). Por um lado a intenção da Bauhaus era formar artistas, designers e arquitetos mais responsáveis socialmente. Por outro, ela pretendia nada menos do que o progresso da vida cultural da nação e o aperfeiçoamento da sociedade. Com tais propostas utópicas, a Bauhaus pode ser mais entendida no contexto dos debates travados na Alemanha (e em outros países) desde o fim do século XIX. No manifesto que acompanhava o programa da nova escola, Gropius escreveu:

Vamos desejar, conceber e criar juntos o novo edifício do futuro, que combinará tudo – arquitetura e pintura – em uma única forma , a qual, um dia, se erguerá em direção aos céus, das mãos de um milhão de trabalhadores, como um símbolo cristalino de uma nova e vindoura fé.

A crença de Gropius no poder transformador da arte e da arquitetura o liga a grupos contemporâneos que compartilhavam aquelas crenças, o *Arbeitsrat für Kunst, do qual ele era presidente, o Deutscher Werkbund, o *Grupo de Novembro e a Corrente de Vidro, de Bruno Taut. Groupius era membro de todos esses grupos e também estava muito próximo dos pintos expressionistas. Não foi coincidência o fato de, para a capa do manifesto da Bauhaus, ele escolher uma xilogravura de Lyonel Feininger (1871-1956), pintor associado a *O Cavaleiro Azul. Em seu texto “Conceito e desenvolvimento da escola estatal Bauhaus”, publicado em 1924, ele reconheceu as influências que atuaram sobre seu pensamento: John Ruskin e William Morris, do movimento *arts and crafts, Henry van der Velde (*Art nouveau) e Peter Behrens (Jugendstil), descrevendo-os como pessoas que “procuraram conscientemente e encontraram os primeiros caminhos que levaram à reunificação do mundo do trabalho com os artistas criativos”. Gropius reuniu um grupo extraordinário de artistas-professores para a nova escola. “Não podemos começar com mediocridade”, explicou. “É nosso dever recrutar personalidades famosas e poderosas, sempre que possível, mesmo que ainda não as compreendamos inteiramente”. Entre 1919 e 1922 Gropius contratou Feininger, os pintores suíços Johannes Itten (1888-1967) e Paul Klee, os alemães Gerhard Marcks (1889-1981), Georg Muche (1895-1987), Oskar Schlemmer (1888-1943) e Lothar Schreyer (1886-1966), além do pintor russo Vassili Kandinski.


Joost Schimidt, cartaz para a exposição da Bauhaus, julho-setembro 1923

Após modificações relativas à direção e à política, o cartaz, criado por Schimidt quando era estudante da Bauhaus, distanciava-se imediatamente da xilogravura expressionista do primeiro manifesto. A exposição foi um sucesso e atraiu 15 mil visitantes.

Itten desenvolveu o aclamado curso preliminar, obrigatório para todos os alunos. Era seu objetivo livrar os alunos dos conceitos clássicos e preconcebidos de formação no campo das artes e de liberar seu potencial criativo. O curso incluía estudos sobre materiais, utensílios e teoria da cor, análise da estrutura pictórica dos antigos mestres, meditação e exercícios de respiração. Os cursos teóricos mais importantes eram os referentes à cor e à forma, dados por Kandinski e Klee. A insistência de Itten na experiência pratica, que se ligava à teoria educacional progressista do filósofo americano John Dewey (“aprender fazendo”) tornou-se um modelo seguido por escolas de arte e design no mundo inteiro.

Após completar com sucesso o curso preliminar, os estudantes passavam a freqüentar oficinas, onde recebiam ensinamentos de um artista e de um artesão experiente. Em 1922, apesar dos recursos limitados, existiam oficinas de construção de escritório (Gropius); escultura em madeira e pedra (Schlemmer); pintura mural (Kandinski); pintura sobre vidro e encadernação (Klee); artefatos de metal (Itten); cerâmica (Marcks); tecelagem (Muche); impressão (Feininger) e teatro (Schreyer). Àquela altura ainda fazia falta à Bahaus um departamento de arquitetura, embora Gropius lecionasse sobre “Espaço” e seu sócio no escritório de arquitetura, Adolf Meyer (1881-1929), ensinasse desenho técnico em meio período até 1922.

Apesar desses esforços, pouco se avançou em direção a um relacionamento mais intimo de trabalho com a indústria. Apenas as oficinas de cerâmica e de tecelagem foram bem-sucedidas no sentido de receber encomendas de fora. Esse malogro chamou a atenção. Em 1922, a Bauhaus foi objeto de pesadas críticas por parte do periódico holandês De Stijl, que pediu uma mudança na direção. A raiz do problema estava no fato de que alguns dos primeiros professores (sobretudo Itten) apregoavam o conceito de arte como atividade espiritual, divorciada do mundo exterior. A arte havia fundido com o artesanato, mas não com a indústria. Para que a Bauhaus florescesse, o artista teria de se transformar, passando de visionário místico e expressionista a engenheiro técnico *construtivista. Artistas de *De Stijl, como El Lissitski (que visitou a escola em 1921) e Theo van Doesburg (que lecionou cursos extracurriculares sobre os princípios do De Stijl em Weimar, entre 1921 2 1923) puseram todo o peso de sua influência em favor dessa transformação. Após breve disputa, Itten demitiu-se em 1923 e foi substituído pelo húngaro László Moholy-Nagy (1895-1946), artista de orientação tecnológica, cuja obra e conceitos refletiam suas conexões com o *ativismo húngaro, De Stijl e o construtivismo. Moholy-Nagy e um ex-aluno da Bauhaus, Josef Albers (1888-1976), modificaram a ênfase dada ao Curso Preliminar, incentivando os alunos a assumir uma abordagem mais prática de seu trabalho, testando novas técnicas e novas mídias. Moholy-Nagy também modificou o perfil da oficina de artefatos de metal, que produzia objetos artesanais, peças únicas, feitas a mão (um aluno referia-se a elas como “samovares espirituais e maçanetas intelectuais”), introduzindo designs práticos de protótipos para a indústria. Modificações semelhantes se deram na oficina de teatro, onde Schlemmer substituiu Schreyer em 1923.

Essa nova orientação foi divulgada por uma importante exposição da Bauhaus organizada em 1923 por Gropius, cujo discurso de inauguração intitulava-se “Arte e tecnologia – Uma nova unidade”. Um dos destaques da exposição foi a Casa Experimental, projetada por Muche e Meyer, um protótipo de habitação funcional, barata, produzida em série, em cuja construção se empregariam os mais recentes materiais (aço e concreto) e que seria equipada com tapetes, radiadores, azulejos, luminárias, cozinha e mobiliário projetados e executados pelas oficinas da Bauhaus.
Ocorreu, porém, que tão logo a escola fundada pelo Estado começou a prosperar, o clima político em Weimar oscilou para a direita e a Bauhaus, que seguia políticas socialistas, foi imediatamente prejudicada. Em 1925, a maioria nacionalista do governo de Weimar suprimiu as dotações da escola. No mesmo ano ela se mudou para a cidade socialista de Dessau, onde recebeu recursos para construir edificações especialmente projetadas para a escola, os alunos, professores e funcionários.
Após a mudança para Dessau, Gropius esperava que finalmente a Bauhaus direcionaria seu enfoque para a arquitetura. Uma declaração, feita naquela época, resumia os princípios adotados mais tarde pelo *Estilo Internacional:

Queremos criar uma arquitetura clara, orgânica, cuja lógica interna será radiosa e despojada, desimpedida de fachadas e truques mentirosos; queremos uma arquitetura adaptada ao nosso mundo de máquinas, rádios e velozes carros a motor, uma arquitetura cuja função seja claramente reconhecível na relação de sua forma.

Outro acontecimento importante em Dessau foi a contratação de seis ex-alunos como professores em perído integral: Marcel Breuer (1902-1981); Herbert Bayer (1900-1985); Gunta Stölzl (1897-1983); Hinnerk Scheper (1897-1957); Joost Schmidt (1893-1948) e Albers. Como primeiro corpo docente formado pela Bauhaus, eles eram versáteis, competentes tanto na teoria como na prática e em inúmeras disciplinas e materiais. A produção de suas oficinas e do novo departamento de arquitetura, implantado em 1927 sob a direção do arquiteto suíço Hannes Meyer (1889-1954), criou um novo design da Bauhaus, caracterizado pela simplicidade, requinte da linha e da forma, abstração geométrica, cores primárias e o emprego de novos materiais e tecnologias. Exemplos disso são a fonte sem serifa, em caixa baixa, usada como estilo da Bauhaus, criada por Bayer, o mobiliário de aço tubular, criado por Breuer, e o projeto de casas populares empreendido pelo departamento de arquitetura em Dessau-Törten (1927-8).

Após dedicar nove anos de sua vida à administração e defesa da escola, Gropius estava ansioso para voltar a suas atividades particulares. Demitiu-se em 1928 e designou Meyer como seu sucessor. No entanto, o programa de Meyer, descomprometido com a esquerda, não entusiasmava seus colegas. Moholy-Nagy, Breuer e Bayer se demitiram, queixando-se de que o espírito comunitário havia sido substituído pela competição individual. A partir daí, a escola transformou-se numa instituição vocacional, voltada para a formação de arquitetos e desenhistas industriais. Foram criados novos cursos, incluindo o planejamento urbano, ensinado por Ludwig Hilbersheimer (1885-1967)e fotografia, sob a responsabilidade de Walter Peterhans (1897-1960). Conferencistas convidados realizaram palestras sobre sociologia, teoria política marxista, física, engenharia, psicologia e economia. Sob a direção de Meyer a escola tornou-se um sucesso comercial pela primeira vez na história. A Körtinge Mathiesen começou a fabricar luminárias criadas na oficina de artefatos de metal orientada por Marianne Brandt (1893-1983), ex-aluna da escola. O papel de parede criado na oficina de murais também começou a ser produzido industrialmente e as oficinas de tecelagem, mobiliário e cartazes de publicidade foram igualmente bem-sucedidas, passando a receber encomendas de fora.
A orientação marxista de Meyer, no entando, em breve o distanciou do governo local e ele se viu forçado a se demitir em 1930, sendo substituído pelo arquiteto Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969). Mies van der Rohe implantou uma disciplina mais rigorosa e se empenhou em distanciar a escola da política. Mas já era tarde demais. Com a vitória do Partido Nacional-Socialista nas eleições locais, em 1931, a escola foi acusada de ser excessivamente cosmopolita e não suficientemente "alemã". Em 1932 as subvenções foram canceladas. Foi feita uma última tentativa desesperada de salvá-la, mudando-a para Berlim e alojando-a numa instituição privada. Isso durou até abril de 1933, quando finalmente os nazistas a fecharam, declarando que era "um dos mais óbvios refúgios do conceito judaico-marxista de 'arte'".

Os nazistas, sem o querer, garantiram a fama da escola. Embora a Bauhaus, como instituição, chegasse ao fim em 1933, como idéia ela ganhou ímpeto. Sua ideologia e reputação já haviam alcançado um vasto público por meio de seu periódico Bauhaus (1926-1931) e da coleção sobre arte e teoria do design organizada por Gropius e Moholy-Nagy entre 1925 e 1930. A emigração forçada de muitos de seus professores e alunos disseminou seus conceitos para o mundo todo. Muitos deles emigraram para os Estados Unidos e lá foram acolhidos como heróis. Gropius e Breuer integraram o corpo docente da Universidade de Harvard; Moholy-Nagy abriu a Nova Bauhaus em Chicago, em 1937, futuro Instituto de Design de Chicago; Mies van der Rohe tornou-se diretor do Departamento de Arquitetura do Instituto Armour de Chicago (mais tarde, Instituto de Tecnologia de Illinois) e Albers lecionou no Black Mountain College, Carolina do Norte.

Amy Dempsey
Estilos, Escolas & Movimentos

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